Page 35 Volume 11, Número 3, 2003
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Dor (2003) 11 Avelino A, et. al.: A anandamida, um agonista endógeno do receptor vanilóide

A Anandamida, um Agonista Endógeno


do Receptor Vanilóide, Aumenta Durante

a Inflamação da Bexiga e Contribui


para a Hiperreflexia e Alodínia



Charrua A , Dinis P , Avelino A , Nagy I , Yacoob M , Cruz F 1,2
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Resumo
A anandamida (ANA), um lipídeo endógeno, mostrou capacidade de activar o receptor vanilóide (VR1) in
vitro. Dado que a ANA é um agonista endógeno quer do VR1, quer do receptor canabinóide 1 (CB1),
estudou-se (i) a variação da concentração da ANA na cistite crónica; (ii) o efeito da aplicação de ANA e de
ANA em conjunto com SR141716A, um antagonista do CB1, e com a capsazepina (CPZ), um antagonista do
VR1, em bexigas normais de ratos, e (iii) a possibilidade da ANA induzir dor na bexiga e desta ser mediada
por nociceptores sensíveis à capsaicina. Verificou-se que: (i) a ANA aumenta na inflamação; (ii) a sua
aplicação aumenta as contracções vesicais, e (iii) que induz dor através de nociceptores sensíveis à
capsaicina. Estes resultados podem ser relevantes para a compreensão da dor e da hiperactividade da
bexiga durante a inflamação.

Palavras chave: Inflamação vesical. Anandamida. Receptor vanilóide tipo 1. Receptor canabinóide 1.
SR141716A. Capsazepina.







Introdução nos animais e hiperactividade vesical em am-
O receptor vanilóide tipo 1 (VR1) é um canal bos (Maggi, et al., 1989; Cruz, et al., 1996).
catiónico não selectivo (McCleskey e Gold, Os mecanismos de activação do VR1, duran-
1999). Este receptor parece desempenhar um te a inflamação crónica da bexiga, não são
papel importante no desenvolvimento da alodí- ainda bem conhecidos. Isto deve-se, em parte,
nia (Vizzard, 2000) e da hiperactividade vesi- ao desconhecimento de uma substância endó-
cais (Cruz, et al., 2002) subsequentes à infla- gena que possa activar o VR1, tal como a
mação da bexiga. De facto, a regulação capsaicina o faz. Os mecanismos de activação
negativa do VR1 através da acção da resinife- endógena do VR1 que têm sido propostos in-
ratoxina (RTX) diminui a alodínia e a hiperactivi- cluem a baixa do pH no tecido inflamado e a
dade vesical em ratos cujas bexigas foram acumulação de mediadores inflamatórios, tais
cronicamente inflamadas por um agente quími- como o NGF e a bradicinina (Cesare e McNau-
co (Dinis, et al., submetido para publicação). ghton, 1996; Miller, et al., 2002). Contudo, a
Por outro lado, a aplicação de um ligando existência de um agonista endógeno, com ca-
exógeno específico do VR1, a capsaicina, des- racterísticas semelhantes às da capsaicina é
perta dor no homem, comportamento doloroso ainda desconhecido.
Recentemente, a anandamida (ANA), um lipí-
deo com uma cadeia alifática, semelhante à da
capsaicina, sintetizado por macrófagos, pelo
1 Instituto de Histologia e Embriologia, Faculdade de endotélio vascular (Di Marzo, et al., 1996) e por
Medicina do Porto e IBMC, 4200-319 Porto, Portugal aferentes primários (Ahluwalia, et al., 2003),
2 Departamento de Urologia, Hospital S. Jão, mostrou activar o VR1, em experiências condu-
4200-319 Porto, Portugal zidas in vitro (Zygmunt, et al., 1999). De facto,
3 Departamento de Anestesia, Imperial College, Chelsea
and Westminster Hospital, Londres, Reino Unido a ANA induz vasodilatação e libertação de DOR
4 Novartis Institute for Medical Research, Londres, CGRP em vasos sanguíneos de rato, que são
Reino Unido bloqueadas pela capsazepina (CPZ), um anta 15
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