Page 31 Volume 11, Número 3, 2003
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Dor (2003) 11 Dor (2003) 11 Cristina F. Fernandes: Mesa redonda: Continuidade de cuidados de enfermagem ao doente oncológico com dor
devem ser usadas como adjuvantes das inter- facilitar a adaptação e promover a qualidade de
venções farmacológicas. A utilização de técni- vida, e que poderá incluir, por exemplo, o ensino
cas cognitivo-comportamentais como a hipnose, de estratégias psicológicas de controlo de dor Mesa redonda
os treinos de relaxamento, o biofeedback, a e/ou de outros sintomas. Caso numa primeira
distracção, a imagética e a redefinição podem abordagem não se considere pertinente o acom- O doente oncológico com dor - continuidade
ajudar o doente no confronto com a sua dor. Por panhamento psicológico do doente, este deverá dos cuidados de enfermagem
exemplo, o relaxamento alivia a dor ou evita que repetir a avaliação psicológica com regularidade,
esta se torne mais intensa através da redução assim, a mesma é repetida um mês, três meses
da tensão muscular de causa espasmódica. e seis meses após a primeira consulta e anual- Introducção e Conclusões
Turk e Rennet (1981) propuseram um progra- mente em doentes seguidos em consulta médica
ma psicológico para o controlo da dor, que in- de follow-up.
cluía a utilização das técnicas distractivas e de A integração da Psicologia na Unidade Tera- Cristina F. Fernandes (moderadora)
relaxamento, e a reestruturação cognitiva proce- pêutica de Dor data de 1983, com a celebração
dendo à disputa de crenças e sentimentos dis- de um protocolo de ensino e investigação com a
funcionais. O objectivo global deste tipo de pro- Faculdade de Psicologia e de Ciências de Educa-
gramas é aumentar a percepção de controlo ção da Universidade de Lisboa, segundo o qual
mostrando ao doente que este tem recursos os alunos finalistas da licenciatura desenvolvem o Se se entender por “continuidade de cuidados” o • Falta de recursos humanos, tanto a nível dos
internos para fazer face à dor, aumentando o seu estágio académico. Será, contudo, apenas conjunto de acções que visam garantir uma transição serviços de internamento, como nas unidades
sentimento de auto-controlo e auto-eficácia. Ape- em 1990, que o Instituto Português de Oncologia adequada de cuidados quando há mudança de pres- de dor, nas unidades de cuidados de saúde pri-
sar da utilização dos programas cognitivo-com- contrata para os seus quadros um psicólogo, tadores, e que esta continuidade deve assegurar que mários.
portamentais se mostrarem eficazes no controlo possibilitando assim, a continuidade do trabalho os cuidados não são interrompidos e que a qualidade • Deficiente formação na área da dor, de um modo
da dor, estes devem ser usados de um modo quer com os doentes quer com a equipa, tendo- é mantida, percebemos que, no caso do doente onco- geral. Parece existir alguma sensibilização mas
criterioso e as técnicas não devem constituir se estabelecido os protocolos de actuação e os lógico, dado que a dor constitui, muitas vezes, uma pouca formação efectiva, aliada à heterogeneida-
actos isolados. Nem todos os doentes devem ser modelos práticos de articulação. A contratação do verdadeira doença, a continuidade de cuidados terá de de culturas e formações no âmbito de enferma-
incluídos em programas psicológicos de controlo psicólogo da equipa possibilitou ainda a articula- que ter em conta, não apenas, o controlo do quadro gem, o que leva a que a dor não seja valorizada
da dor, assim doentes que apresentam a dor ção entre a Unidade de Dor e a Faculdade de álgico, mas o atendimento global de todas as necessi- nem avaliada de forma sistemática.
controlada através da utilização de analgésicos e Psicologia, tendo sido estabelecidos critérios co- dades afectadas. •Desmotivação e não interiorização da importância
têm poucos efeitos secundários ou doentes com muns entre ambos na formação e orientação dos Para além destes aspectos, garantir a qualidade de da continuidade de cuidados.
grandes limitações das suas capacidades não alunos estagiários. cuidados a estes doentes implica trabalhar em parce- Este aspecto pode estar relacionado com os dois
devem ser incluídos neste tipo de programas Nas guidelines proposta pela IASPA para a ria com: anteriores, com o turn-over dos enfermeiros e com a
estruturados, devendo ser avaliados no sentido classificação das unidades de dor, a psicologia •O doente e a família, integrados na equipa multi- dificuldade de comunicação com os doentes e com os
de lhes ser fornecido um apoio psicológico mais surge como um dos elementos indispensáveis na disciplinar que os cuida. próprios parceiros profissionais devido à barreira da
individualizado e focalizado nas dificuldades ou formação de equipas multidisciplinares. O psicó- •Os profissionais da instituição que assiste o doen- língua, pela existência de enfermeiros de outras naci-
constrangimentos apresentados. Deverá enten- logo especialista em dor crónica é o elemento da te (articulação intrainstitucional). onalidades a prestar cuidados, sobretudo espanhóis.
der-se que a intervenção psicológica não se equipa com mais qualificações para avaliar os •Os profissionais de outras instituições envolvidas
esgota na utilização de pacotes terapêuticos mais obstáculos psicológicos do doente, quer no que nos seus cuidados (articulação interinstitucional). Considerações finais
ou menos estruturados, os factores psicológicos respeita à adesão às propostas terapêuticas quer Qual é a realidade da enfermagem ao nível
desempenham um papel importante no decurso na avaliação do travão que o próprio doente Parece não ser fácil a resolução de todos estes pro-
e desenvolvimento da dor crónica, assim o doen- pode exercer no sentido da não recuperação. da “continuidade de cuidados”, nesta área tão blemas, sobretudo do primeiro, pois a carência de pro-
te deve ser acompanhado desde o diagnóstico Para alguns doentes a dor passou a ser a forma específica de cuidados ao doente com dor? fissionais de enfermagem é um problema com que nos
ao tratamento. que eles encontraram de comunicar e interagir Existe, de facto, articulação entre os vamos defrontar talvez mais alguns anos.
Em termos gerais podem traçar-se como ob- com o mundo, e por essa razão tornam-se resis- profissionais envolvidos que assegure a A formação parece ser o aspecto a apontar e de
jectivos de uma Unidade de Dor, o alivio do tentes à mudança. Este know how do psicólogo, conveniente e efectiva continuidade? mais fácil resolução na medida em que o próprio Plano
quadro álgico e a melhoria da Qualidade de Vida servindo de conselheiro, é uma mais valia impor- Com o intuito de perceber esta realidade, colaboram Oncológico Nacional prevê o investimento na forma-
dos doentes, recorrendo-se à terapêutica sinto- tante para as equipas que se dedicam ao trata- nesta mesa redonda três profissionais de enfermagem ção pré- e pós-graduada em oncologia onde, inevita-
mática adequada e ao apoio psicológico. Trans- mento da dor. que cuidam o doente com dor nas possíveis etapas do velmente, se insere a formação na área da dor, a ser já
versal ao acompanhamento do doente com dor, seu ciclo de doença, como sejam a do internamento, a ministrada pelas escolas de enfermagem tanto nos
e para qualquer dos profissionais envolvidos, Bibliografia de seguimento numa unidade de dor em regime ambu- cursos de licenciatura como nas pós-graduações.
deverá estar a questão da avaliação, tendo sem- Lesage P, Portenoy RK. Cancer Control. Journal of the Moffitt Cancer latório e a de necessidade de apoio domiciliário pres- O factor desmotivação, embora possa não vir a ser
pre presente que a dor existe quando o doente Center 1999;6(2):136-45. tado pelas unidades de cuidados de saúde primários. totalmente ultrapassado, constituirá, certamente, fac-
diz que a sente, e no grau em que este a refere. Massie MJ, Holland JC. The cancer patient with pain: psychiatric compli- Também, o marido de uma doente oncológica com tor de menor relevo se os dois primeiros problemas fo-
Ao psicólogo deverá interessar não só a avalia- cations and their management. Medical Clinics of North America dor crónica partilhou connosco o seu Know How rela- rem sendo solucionados.
1987;71(2):243-58.
ção da intensidade, localização e tipo de dor, Portenoy RK, Foley MK. Management of Cancer Pain. Em: Holand JC, tivo a todas as etapas mencionadas.
mas os índices de ansiedade e depressão, a Rowland JH (eds). Handbook of Psychooncology: Psychological care
of patients with cancer. Nova Iorque: Oxford University Press 1989.
avaliação da qualidade de vida e das estratégias Tunks E. Comorbidity of Psychiatric Disorder and Chronic Pain; Pain 1996 – Conclusões Autores para correspondência:
de confronto e adaptação à situação de doença na updated review. IASP Committee of Refresher Courses. Campbell Sandra Neves
e de dor. É com este objectivo que numa primei- JN (ed). Seattle, EUA: IASP Press 1996. À falta de consistência na prática da continuidade Enfermeira do Serviço de Cirurgia de Cabeça e Pescoço
ra consulta o doente é submetido a avaliação Turk D, Holzman A. Pain management – Handbook of Psychological de cuidados de enfermagem ao doente com dor, pare- do IPOFG SA – CROL
Treatment Approaches. Great Britain: Pergamon Press 1986.
das áreas acima mencionadas, e será com base Turk D, Meichenbaum D, Genest M. Pain and Behavioral Medicine: A cem não ser alheios factores como: Fátima Traitolas Naves
Enfermeira da Unidade Autónoma
no resultado dessa mesma avaliação do ponto Cognitive-Behavioral Perspective. Nova Iorque: The Guilford Press “Clínica de Dor” do IPOFG SA – CROL
DOR de vista psicológico, se delineará o processo de Turk DC, Meichenbaum D. Cognitive-behavioral approach to the manage- Maria de Lurdes R. Valério DOR
1983.
acompanhamento psicoterapêutico, apresentan-
30 do-o como proposta ao doente no sentido de lhe ment of chronic pain. Melzack R, Wall PD (eds). Textbook of Pain. Enfermeira Enfermeira do Centro de Saúde da Venda Nova, 31
Unidade Autónoma “Clínica de Dor” do IPOFG SA – CROL
extensão da Brandoa
2 ed. Nova Iorque: Churchill Livingstone 1989:1001-9.
a
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