Page 7 Volume 10, Número 4, 2002
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esquerda; posteriormente referiu aumento das administrou-se 100 mg de lidocaína com adre-
parestesias e início de dores paroxísticas (“sen- nalina (5 ml) com alívio da dor. Reiniciou-se a
tia os pés dormentes, brancos e gelados” [sic]), perfusão de ropivacaína epidural (4 mg/h) que
pelo que recorreu ao Serviço de Urgência, ten- foi modificada ao 5º dia de cateter epidural
do-se procedido ao seu internamento. Os valo- (6 mg/h). Durante o período da suspensão da
res analíticos do sangue revelaram uma anemia administração de anestésicos locais via epi-
moderada microcítica, hipocrómica (doente com dural retomou-se o regime misto de morfina
talassemia minor), aumento da CPK (2.903 U/l), e.v. (Perfusão: 1 mg/h; Bolus: 2,5 mg; Lock
da AST (119 U/l), da VS (113 mm 1ª h) e da P.C. Out: 10 min).
Reactiva (20,2 mg/dl). No 7º dia de cateter epidural o doente deixou
Na avaliação clínica efectuada pela Cirur- também de referir dor nos membros superiores
gia Vascular verificou-se ausência de pulsos (apenas parestesias), pelo que iniciou o des-
pediosos, tibiais e radiais, pulsos debeis po- mame da morfina e.v. (Bolus: 1 mg; Lock Out:
plíteos e umerais e sinais de isquemia marca- 10 min). Constatou-se uma melhoria da colora-
da a nível dos pés e menos grave a nível das ção dos tegumentos dos pés, mantendo no
mãos. Foi medicado por via endovenosa com entanto a ropivacaína em perfusão epidural.
pentoxifilina (vasodilatador periférico; 1.200 Ao 9º dia de cateter epidural suspendeu-se a
mg/dia), alprostadil (prostaglandina E1; vaso- PCA de morfina, e iniciou tramadol p.o. (50 mg
dilatador, hemorreológico, antiinflamatório, an- 12/12 h).
tiaterosclerótico e fibrinolítico; 60 µg/dia) he- A observação neurológica realizada no dia 9/
parina (2.500 U a 1.000 U/h, de modo a 8/00 pela Unidade de Dor, detectou alteração
manter o APTT entre 2-3 vezes o valor de da sensibilidade da planta e porção distal dos
referência) e tramadol endovenoso (100 mg pés (incluindo dedos) com manutenção da for-
8/8 h). O clonixinato de lisina foi prescrito via ça muscular, e a nível da mão esquerda hipoes-
oral (125 mg de 8/8 h). tesia na ponta dos dedos (excepto no 5º
Contactada a Unidade de Dor no dia 26/7/ dedo), com diminuição da força na flexão e
00 procedeu-se à observação e avaliação do extensão do dedo indicador. A sensibilidade
doente e à alteração da terapêutica analgésica, postural e vibratória, o tónus muscular, e os
substituindo o tramadol endovenoso (100 mg 8/ reflexos miotáticos pesquisados estavam con-
8 h) e o clonixinato de lisina oral (125 mg de 8/ servados (os reflexos aquilianos foram impossí-
8 h) por PCA (Patient Controlled Analgesia) veis de pesquisar). Os pares cranianos não
com morfina endovenosa (Perfusão: 1 mg/h; apresentavam alterações. Não foi efectuada fun-
bólus: 2,5 mg; lock out: 10 min). doscopia nem avaliação da marcha. O doente
No dia seguinte para uma melhor vasodilata- não tinha dores significativas além de pareste-
ção e perfusão dos membros inferiores foi colo- sias (“picadas” [sic]) nos dedos dos pés. Ini-
cado um catéter epidural com tunelização ciou a redução da dose de ropivacaína epidural
para o flanco esquerdo, ao nível de L2-L3 com (4 mg/h) e de tramadol p.o (50 mg 24/24 h). Ao
extremidade em T12. Administrou-se um bolus 22º dia suspendeu o tramadol.
inicial de 17,5 mg de bupivacaína (14 ml) e Ao 26º dia, dada a sintomatologia álgica,
perfusão de ropivacaína a 6 mg/h (3 ml/h). A suspendeu a perfusão de ropivacaína a 2 mg/
morfina endovenosa (e.v.) foi mantida só em ml por via epidural e passou a PCEA (Patient
regime de PCA (Bolus: 1,5 mg; Lock out: 10 Controlled Epidural Analgesia) com ropivacaína
min) para adequada analgesia dos membros em bolus de 6 mg (3 ml) e lock out de 10 min.
superiores. Ao 27º dia da sua colocação suspendeu-se a
Passadas 12 h, o doente encontrava-se sem PCEA e retirou-se o catéter.
dores, referindo apenas parestesias nos mem- No 28º dia da colocação do cateter epidural,
bros superiores (principalmente à esquerda) após uma relativa boa evolução do processo
com função motora mantida e desconforto hi- isquémico (mantinha dificuldade na mobiliza-
pogástrico devido a retenção urinária. Efec- ção da mão esquerda e isquemia grave e irre-
tuou-se o esvaziamento vesical e foi reduzida versível a nível da parte distal da planta e
a perfusão epidural de ropivacaína para 4 mg/h dedos dos pés), o doente teve alta do Serviço
(2 ml/h). de Infecciologia com indicação para fisioterapia de
Ao 2º dia da colocação do cateter epidural o reabilitação da mão esquerda e pensos dos
doente referiu agravamento das queixas álgicas pés na consulta de Cirurgia Vascular, onde foi
dos membros inferiores assim como parestesias seguido semanalmente.
e diminuição de força muscular (quase ausên- Na consulta constatou-se uma delimitação
cia à direita). Suspeitou-se de possível hemato- progressiva da área isquémica dos membros
ma epidural, pelo que se suspendeu a ropiva- inferiores, sendo programado o internamento
caína epidural. Pediu-se a observação pela na Cirurgia Vascular para amputação da por-
Neurocirurgia, que sugeriu a realização de res- ção distal dos pés no 41º dia.
DOR sonância magnética nuclear lombar. Esta reve- tatársica bilateral) em segundo tempo ao 44º
O doente foi operado (amputação transme-
lou-se normal, excluindo a hipótese de hemato-
8 ma epidural. Testado o cateter epidural dia, sob anestesia locorregional (Bloqueio Su-