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Dor (2006) 14
reforçar os mecanismos de adaptação face à – Trimetazidina: 20 mg – 1 cp 3/d.
doença e às perdas, bem como ajudar na re- – Furosemido: 40 mg – 1 cp jejum.
orientação da procura de algum sentido para – Espironolactona: 25 mg – 1 cp 2/d (que
a vida. iniciou).
– Alfasosina: 0,4 – 1 cp 1/d.
Estudo de caso – Dor vascular – Naproxeno: 1 cart SOS.
Doente varão, 78 anos, viúvo há cerca de – Lorazepam: 2,5 mg – 1 cp deitar e mais ½
20 anos. A esposa era enfermeira na área da sublingual se muito ansioso.
pediatria, e nunca tiveram filhos. Ficou programada visita em dias alternados
Apresenta como antecedentes pessoais: insu- (inclusive fim-de-semana) para realização do tra-
ficiência cardíaca grau III, HTA, insuficiência ve- tamento e controlo de sintomas e apoio psicoe-
nosa crónica dos membros inferiores, com ante- mocional. Foi enfatizada a necessidade de repou-
cedentes de episódio de tromboflebite no so com os membros inferiores elevados e a
membro inferior esquerdo há alguns anos, hiper- possibilidade de o doente nos contactar em caso
plasia benigna da próstata e dispepsia não ul- de urgência, descontrolo grave de sintomas.
cerosa. Feita nova visita a 18/08/2005: o utente melho-
Necessita de ajuda parcial para a realização rou dos edemas, mas como mantinha a infecção
das actividades de vida diárias. Vive sozinho e e a dor grave, continuou com a ciprofloxacina e
tem como cuidadores os compadres, que mo- passou a dihidrocodeína a 1 cp 12/12 h. Sentia-
ram perto, e um vizinho. se muito constrangido porque os pensos repas-
Actualmente reformado, trabalhava num cine- savam, sentindo-se assim desconfortável, po-
ma em Lisboa, na área de produção. tenciando a sua percepção de dor e a sua
Foi encaminhado para a equipa de cuidados ansiedade, muito manifesta.
continuados da sua área de residência, por A 23/08/2005, por persistência dos mesmos sin-
apresentar como principais problemas à data da tomas, foi prescrito 6 tomas de ceftriaxona 1 g/d
admissão: úlceras de perna infectadas e dor sc. e subiu-se a dose de dihidrocodeína para
moderada a grave a nível dos membros inferio- 2 cp de 12/12 h. Foi pedido um ecocardiograma
res, com perda de autonomia (cansaço fácil à para reavaliação do quadro de insuficiência car-
mobilização e dificuldade na marcha), que lhe díaca, tendo revelado insuficiência cardíaca mo-
impedia o acesso ao centro de saúde, e ansie- derada, com função sistólica dentro dos limites
dade associada a este quadro sintomático e de normais e regurgitação mitral ligeira.
dependência de terceiros. A 19/09/2005, mantinha o mesmo quadro e intro-
Utente com história de primeira úlcera de perna duziu-se a amoxicilina/ác. clavulânico 875/125 mg
em 1999, com sucessivas recorrências desde 1 cp de 12/12 h, gabapentina 400 mg 1 cp de
2002, tendo anteriormente sido acompanhado na 12/12 h e morfina de acção retard 40 mg/24 h,
Cirurgia Vascular do Hospital dos Capuchos. sendo 30 mg PA + 10 mg jantar – 12/12 h.
Foi feita primeira visita domiciliária pela enfer- A 29/09/2005, a dor continuava com níveis de
meira da nossa equipa a 16/08/2005. O doente intensidade grave, pelo que foi feita reorientação
estava consciente, orientado, encontrava-se quanto às doses de morfina retard, passando a
sentado e muito apreensivo e ansioso. Referiu 60 mg (30 mg + 30 mg) 12/12 h. Por apresentar
dor grave (VAS 12/10!) a nível dos membros humor depressivo, iniciou sertralina 50 mg 1/d.
inferiores, na localização das úlceras. Apresen- Estava muito triste e desanimado com a evolu-
tava TA 140/60 mmHg, pulso 85 p/min. Na rea- ção das feridas. Achava que, apesar dos trata-
lização do tratamento das feridas observámos mentos, não havia melhorias. Sente-se progres-
que apresentava edema, isquemia, lipodermo- sivamente a perder funções e a estar cada vez
esclerose, bordos irregulares, lesões profundas, mais dependente de outros.
com tecido fibrinoso, com odor, exsudado sero- A 11/10/2005, mantém dor não controlada e a
purulento abundante, com dor contínua e pele infecção não estava suficientemente debelada.
circundante com eritema. Foi feita revisão tera- Foi feita reavaliação terapêutica: manteve tera-
pêutica com a médica de serviço na equipa, pêutica anterior com excepção de paracetamol,
tendo-se abordado pela primeira vez a hipótese que passou a 1 g em SOS, a trimetazidina LM
de utilização de opióides fortes e valorizado o 1/d, introduziu-se lactulose (1 cart 2/d), e a ga-
papel da ansiedade na expressão da dor. O re- bapentina 400 mg foi aumentada para 1 cp 3/d.
gime terapêutico estabelecido em consenso e A morfina é reduzida para 50 mg (30 PA + 2 cps
aceite pelo doente foi o seguinte: de 10 jantar) 12/12 h. O doente verbalizou que
– Diosmina: 500 – 2 cps 2/d. as dores aliviavam mais com o paracetamol do
– Lanzoprazol: 30 mg – 1 cp jejum. que com a morfina, facto que estranhámos e
– Sucralfato: 1 cart 3/d (15-30 min antes das com o qual o confrontámos. Percebemos que,
refeições). na sua dor, era evidente muito de sofrimento
– Ciprofloxacina: 750 – 1 cp 12/12 h. existencial e ansiedade, com alguma sugestão
DOR – Paracetamol: 1 g 8/8 h, mais 1 g em SOS. de permeio: quando o distraíamos, como por
exemplo no momento de realização do penso,
– Dihidrocodeína: 60 mg – 1/2 cp de 12/12 h
32 (que iniciou). ele conseguia rir e esquecer-se que naquele
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