Page 19 Volume 10, Número 4, 2002
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V. Galhardo: Codificação populacional da dor: O papel das redes neuronais espinais e talâmicas na génese e manutenção de dor persistente
Figura 3. Índice de conectividade entre pares de
neurónios em função da distância interneuronal.
e a segunda inicia-se 20-25 min. após a
injecção e dura entre 20 a 30 min); o interesse
deste modelo está em que estas duas fases
electrofisiológicas estão em absoluta correla-
ção temporal com as duas fases de manifes-
tações comportamentais de sintomas doloro-
sos observadas em animais despertos
(Tjølsen, et al., 1992), e no facto de se reco-
nhecer que estes dois momentos de dor es-
pontânea têm diferentes sensibilidades
farmacológicas, indicando que se apoiam em
mecanismos neuronais que não são
Figura 2. Alterações na classificação fisiológica dos absolutamente idênticos (Morrow, et al., 1998;
neurónios talâmicos registados. Cada linha representa Coderre & Melzack, 1992; Haley, et al., 1990).
um neurónio e identifica a sua classificação antes e Foram registadas 8 populações espinais
depois da lesão periférica. LT – neurónio low-threshold;
WDR – neurónio wide-dynamic range; NS – neurónio (um total de 54 neurónios, 6,75 ± 0,45 por
nociceptive-specific; Ø – neurónio sem campo receptivo registo), e ainda três populações controlo
identificável. (14 neurónios).
As respostas neuronais anteriores à injecção
subcutânea de formol foram comparadas com
as respostas obtidas 90 min depois. A figura 4A
apresenta os diagramas de actividade induzida
as interneuronais inferiores a 20 µm), enquan- por estimulação periférica inócua e dolorosa,
to 180 min após a constrição houve um signi- prévios e posteriores à injecção, de 6 neurónios
ficativo aumento do índice de conectividade espinais registados simultaneamente.
para os pares de neurónios mais afastados A maioria dos neurónios registados (44/54)
entre si (distâncias interneuronais superiores respondia a estimulação periférica inócua ou
a 40 µm (Fig. 3). dolorosa aplicada na pele glabra da região
ventral da pata posterior direita; dos 10 neuró-
Plasticidade das populações espinais nios que não respondiam à estimulação desta
O protocolo experimental de preparação região cutânea, 8 apresentavam actividade es-
dos animais foi em tudo idêntico ao das expe- pontânea (p. ex. neurónio #1 na figura 4A), e
riências talâmicas, com a diferença que neste apenas 2 não apresentavam actividade espon-
caso se procedeu a uma laminectomia lombar tânea antes da injecção de formol, sendo con-
ipsilateral à representação da pata esquerda. siderados neurónios estritamente silenciosos
Nas experiências com populações espinais (p. ex. neurónio #3 na figura 4A). Não foi feita
foi utilizado o modelo da injecção subcutânea nenhuma tentativa de demarcação detalhada
de formol diluído (Tjølsen, et al., 1992; das áreas dos campos receptivos, pelo que se
Duboisson & Dennis, 1977). A escolha deste deve admitir que estes dois neurónios silencio-
modelo de hiperalgesia em detrimento do sos poderiam eventualmente responder a esti-
modelo PSL teve por base o facto da injecção mulação táctil fora da face ventral da pata
subcutânea de formol induzir um padrão muito posterior.
característico de resposta espontânea em Em todas as experiências realizadas, a injec-
neurónios WDR das lâminas profundas da ção de formol alterou imediatamente o limiar de
medula espinal (Dickenson & Sullivan, 1987. excitabilidade mecânica da maioria das célu-
Esse padrão característico consiste em duas las; nos casos em que esse limiar não se
fases de despolarizações espontâneas (a pri- alterou imediatamente após a injecção, a com- DOR
meira inicia-se imediatamente após a injec- paração da resposta inicial com a resposta
ção de formol e dura aproximadamente 5 min, obtida 90 min depois revelou a progressiva 23