Page 29 Volume 11, Número 3, 2003
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Dor (2003) 11 Dor (2003) 11 Maria do Rosário Bacalhau: Mesa redonda: Integração da Psicologia numa Unidade de Dor
42,9% 21,4%
Mesa redonda
28,6% 28,6% A dor, os afectos e os comportamentos
78,6% Integração da Psicologia
numa Unidade de Dor
Sulfato de morfina Cloridrato de morfina Fentanil TTS Espontânea Incindental
Maria do Rosário Bacalhau
Figura 3. Terapêutica opióide Figura 5. Caracterização da dor
50,0% Às 24 h de titulação 9 doentes atingiram a
dose eficaz com 200 µg de OTFC, 2 doentes
atingiram a dose eficaz com 400 µg e 1 doente
atingiu a dose eficaz com 600 µg de OTFC. O último século representou sem dúvida um A dor, no doente oncológico não tem uma
28,6% Dois doentes interromperam terapêutica: grande marco no desenvolvimento das ciências, causa única. Esta pode resultar directamente do
21,4% * 1 por vómitos incoercíveis; surgiram novas descobertas que permitiram a tipo de tumor, dos procedimentos utilizados no
* 1 por problemas gastrointestinais não rela- cura de doenças infecciosas, procedeu-se à in- tratamento, ou por condições clínicas pré-exis-
cionados com a terapêutica. trodução de tecnologias sofisticadas no trata- tentes. Sendo a situação mais comum a com-
mento de doenças várias, diminuição da mortali- pressão exercida pelo tumor nas terminações
Conclusão dade com o consequente aumento da esperança nervosas, em vários órgãos, ou por metastização
Antiepilépticos Antidepressivos AINEs Em todos os doentes em que foi utilizado o média de vida, mas como custo assistiu-se tam- óssea. Aproximadamente 30 a 50% dos doentes
citrato de fentanil transmucoso oral para tratar bém a um aumento da morbilidade e ao aumento oncológicos experienciam dor enquanto se en-
Figura 4. Terapêutica adjuvante do número de doenças crónicas. Esta cronicida- contram em fase de tratamento activo, e em
os episódios de dor irruptiva os resultados fo- de crescente tem trazido outro tipo de preocupa- doentes oncológicos em fase avançada a dor
ram positivos e consonantes com a literatura ções, nomeadamente, o controlo dos sintomas surge em 70 a 90% dos casos (Lesage & Porte-
Como já foi dito, todos os doentes estavam sob existente. como a dor e a promoção da qualidade de vida. noy (1999)). No que diz respeito à intensidade de
terapêutica com opióides, sendo que seis estavam O único doente que interrompeu medicação Nas últimas décadas assistiu-se a um interesse dor 40 a 50 % dos doentes descrevem-na como
medicados com sulfato de morfina, quatro com por efeitos secundários estava medicado com crescente da comunidade científica na área do moderada a severa, enquanto 25 a 30% a des-
cloridrato de morfina e quatro com fentanil tts. dose baixas de opióides (30 mg/dia de sulfa- tratamento da dor crónica. A este facto está sem crevem como severa.
Dos doentes submetidos a terapêutica com to de morfina), e mais uma vez existiu conso- dúvida associada a incidência do síndrome dolo- Contudo, a verdadeira dimensão do problema
OTFC, sete tinham associados analgésicos an- nância com a literatura uma vez que o citrato roso em algumas das doenças crónicas mais não nos é revelada pelos dados e estatísticas.
tiinflamatórios não esteróides e sete faziam te- de fentanil apenas deve ser utilizado em do- prevalentes nos nossos dias. Para o individuo doente a dor é “enervante e
rapêutica com fármacos coadjuvantes (antiepi- entes que façam terapêutica com pelo menos Existe um reconhecimento crescente de que desmoralizadora”, produz alterações profundas
lépticos e antidepressivos). 60 mg/dia de opióide. a dor é uma experiência preceptiva complexa quer a nível afectivo quer comportamental o que
Em relação à caracterização da dor dos doentes Quando correctamente utilizado, o fármaco influenciada por uma larga variedade de facto- aumenta o sofrimento quer do doente quer da
em que se utilizou o OTFC, 11 doentes apre- atingiu as expectativas esperadas no tratamen- res psicossociais, que incluem: aspectos emo- família. Os doentes de cancro que sofrem de dor
sentavam dor espontânea e 3 doentes apresen- to da dor irruptiva. cionais, sociais, contexto social, significado da crónica apresentam mais distúrbios psicológicos,
tavam dor incidental (Figura 5). dor para o indivíduo, crenças, atitudes e ex- Tunks (1996) refere que cerca de 60% destes
Podemos, ainda, definir para melhor caracte- Bibliografia pectativas assim como os factores biológicos. doentes apresentam sintomas de depressão e
rização da dor que: 1. Streisand JB, Varvel JR, Stanski DR, et al. Absorption and bioava- Assim, a abordagem clínica e a investigação ansiedade reactivos à dor intensa. Apesar de
1) duração média dos episódios de dor irrup- liability of oral transmucosal fentanyl citrate. Anesthesiology tem-se caracterizado pela multidisciplinaridade o reactivo, este distúrbio psicológico contamina as
tiva foi de 28,9 min; 1991;75:223-9. que resulta directamente do reconhecimento da competências de confronto do individuo, e ampli-
2) o número médio de episódios de dor irrup- 2. Portenoy RK, Payne R, Coluzzi P, et al. Oral transmucosal complexidade do fenómeno doloroso. fica a percepção da intensidade de dor.
tiva nas 24 h foi de 2,57 episódios; fentanyl citrate (OTFC) for treatment of breakthrough pain in A dor é uma experiência pessoal, uma respos- Nas últimas décadas passou a ser aceite que o
cancer patients: a controlled dose titration study. Pain 1999;
3) que a intensidade média dos episódios 79:303-12. ta subjectiva comunicada por palavras e acções, tratamento eficaz da dor crónica deve contemplar
avaliados pela escala visual analógica 3. Colluzy PH, Schwartzberg L, Conroy JD, et al. Breakthrough cancer e, seja qual for a definição adoptada, dor é uma não só os aspectos físicos mas também os psico-
(EVA) foi de 8,78. pain: a randomized trial comparing oral transmucosal fentanyl sensação que magoa e provoca sofrimento. A lógicos, reconhecendo-se que uma intervenção
citrate (OTFC) and morphine sulfate immediate release (MSIR).
Dos 14 doentes estudados Pain 2001;91:123-30. experiência dolorosa é um fenómeno complexo apropriada facilitará o tratamento da dor e ajudará
* 13 iniciaram titulação com 200 µg; 4. Portenoy RK, Hagen NA. Breakthrough pain: definition, prevalence com aspectos físicos, comportamentais, cogniti- a reduzir o sofrimento do doente e da família.
and characteristics. Pain 1990;41:273-82.
* um doente iniciou a titulação com 400 µg 5. Caracini A, Portenoy RK, et al. International survey of cancer pain vos, emocionais, espirituais e interpessoais, e A pedra basilar para um tratamento eficaz é
de OTFC. characteristics and sindromes. Pain 1999;3:30-9. esta multidimensionalidade deve ser tomada em sem dúvida o estabelecimento de uma relação
conta quer na avaliação quer no tratamento do de confiança entre o doente e os profissionais de
sindroma doloroso. saúde (médicos, psicólogos, enfermeiros), sendo
crucial que o doente sinta que estes acreditam
nas suas queixas de dor e que estão empenha-
DOR Psicóloga Clínica dos no seu tratamento. DOR
No caso da dor crónica oncológica, as inter-
28 Unidade Autónoma “Clínica de Dor” venções psicológicas para o controlo da dor 29
do IPOFG SA – CROL

