Page 16 Volume 17 - N.3 - 2009
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P. Oliveira, M.E. Costa: Abordagem Psicossocial da Fibromialgia
não serem conclusivos no que se refere à preva- associou positivamente com a percepção do es-
lência superior de perturbações emocionais es- tado de saúde. Assim sendo, os nossos resulta-
pecíficas na FM (ex.: depressão, ansiedade) 15-17 , dos não permitem sustentar dados empíricos
os nossos resultados vão ao encontro dos encon- prévios, bem como teorias sobre os efeitos di-
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trados por Quartilho , reflectindo assim a varia- rectos e amortecedores que o suporte social po-
bilidade de estados emocionais negativos que derá ter sobre a saúde/doença, nomeadamente
tendem a acompanhar os processos de doença na vivência de síndromes de dor crónica 22-24,40 .
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somática . Apesar do presente estudo não per- Questionamos assim que a medida por nós utili-
mitir identificar a direcção dos mecanismos cau- zada – o Social Support Questionnaire – apesar
sais entre perturbações emocionais e FM, refor- de apresentar robustez psicométrica, poderá
ça a importância de considerar esta variável na não ter sido a mais apropriada para discriminar
avaliação e intervenção do paciente com FM. especificidades entre os grupos.
No que se refere à afectividade, foram encon- Em relação às estratégias de coping com a dor
trados elevados índices de afectividade negati- crónica, destaque-se que a preocupação tende a
va entre pacientes com FM, o que reflecte a associar-se com piores níveis de percepção do
tendência destes indivíduos em experienciar estado de saúde. Além do mais, registou-se uma
elevados níveis de stress e pessimismo em ge- utilização superior desta estratégia por parte dos
ral; verifica-se ainda a tendência em vivenciar indivíduos com FM, comparativamente com os do-
níveis reduzidos de afectividade positiva, o que entes com AR, tal como encontrado em estudos
transmite uma postura triste e letárgica perante prévios 8,28 . A preocupação consiste na tendência
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a vida 18,19 . Segundo Hassett, et al. , uma eleva- em apresentar pensamentos desadaptativos rela-
da afectividade negativa e reduzida afectividade tivamente à interpretação da dor e permanecer
positiva reflecte um «estilo depressivo» de ba- vigilante face a potenciais estímulos dolorosos, de
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lanço afectivo. Segundo a mesma categoriza- modo a evitá-los . Assim, aproxima-se do cons-
ção, os pacientes com AR que apresentaram, no tructo do catastrofismo que tem sido a estratégia
nosso estudo, reduzidos níveis de afectividade de coping com a dor crónica que mais consisten-
negativa e também positiva, podiam ser enqua- temente tem apresentado associações negativas
drados no «estilo de baixa reactividade» pro- em termos de funcionamento físico e psicosso-
posto pelos mesmos autores. Refira-se ainda cial 41,42 . No que se refere à estratégia de distan-
que tendo sido o grupo FM aquele em que foram ciamento, também esta se associou com uma pior
identificados os mais elevados índices de afec- percepção do estado de saúde. Quer a preocu-
tividade negativa, bem como os mais baixos pação quer o distanciamento são estratégias que
índices de percepção do estado de saúde (va- podem ser genericamente designadas por estra-
riáveis estas que se correlacionam inversamente tégias de coping passivo, contrariamente à trans-
entre si), encontra-se assim suporte para a hipó- formação de dor, distracção e redução do nível de
tese de percepção sintomática segundo a qual actividade (estratégias de coping activo) . As-
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indivíduos com elevada afectividade negativa sim, o presente estudo sustenta a importância do
estão mais propensos a relatarem mais queixas enfoque nas estratégias de coping passivo na
somáticas devido à forma negativista e hipervi- avaliação e intervenção junto dos pacientes.
gilante como tendem a percepcionar o mundo,
em geral, e o corpo, em particular. Consideran-
do agora a correlação positiva entre percepção Conclusões
do estado de saúde e afectividade positiva, en- De um modo geral, os nossos resultados forne-
contradas quer na FM, quer na AR, refira-se que cem suporte para a importância da abordagem
a afectividade positiva pode funcionar como uma biopsicossocial na avaliação e intervenção do es-
fonte de resiliência com a dor e com o stress, em tado de saúde do indivíduo com FM, o que implica
indivíduos que padecem de síndromes de dor a integração dos contributos da Psicologia à luz
crónica . De um modo geral, os dados suge- de uma perspectiva multidisciplinar que concep-
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rem-nos que indivíduos com FM podem estar tualize o indivíduo no seu todo (dimensão física,
particularmente sujeitos aos efeitos desencade- psicológica e social). A promoção de mudanças
ados por défices ao nível da regulação afectiva, em determinados factores psicossociais poderá,
designadamente a dificuldade em reduzir níveis assim, ser promotora da qualidade de vida.
de afectividade negativa e estimular a afectivi- Em termos de implicações para a prática clíni-
dade positiva, o que se poderá revelar proble- ca saliente-se que, dada a natureza multifactorial
mático para o seu estado de saúde. dos mecanismos envolvidos na génese e perpe-
Referindo agora o suporte social percebido, tuação da FM, a intervenção deve ser concebida
destaque-se que não foram encontradas diferen- em termos multidisciplinares, de modo a que o
ças significativas, entre os grupos no que se contributo das diferentes disciplinas seja coorde-
refere aos índices numérico e de satisfação com nado e integrado em prol do paciente. Porém,
o mesmo. Além disso, não foram registadas as- dado o carácter crónico da patologia e a especi-
sociações entre as referidas variáveis e a per- ficidade do tratamento para cada paciente, o pa- DOR
cepção do estado de saúde, nos grupos FM e ciente assume um papel central na gestão do seu
AR. No grupo NO, apenas o índice numérico se próprio tratamento. A Psicologia tem assumido 15