Page 25 Volume 18 - N.3 - 2010
P. 25
Dor (2010) 18
risco de interacção com agentes anestésicos e Mandrágora, beleno-negro ou Mandragora
com a terapêutica previamente administrada. officinarum
É uma planta da família das Solenaceae, de
Alface brava maior, alface venenosa, alface folhas compridas e largas, flores azuis e cheiro
do ópio, alface silvestre ou Lactuca virosa L. desagradável, florescendo entre o sul da Europa
É uma planta da família das Asteraceae (incluindo a Península Ibérica) e a Ásia.
Referenciada desde a Antiguidade como plan-
(1.100 géneros e cerca de 20.000 espécies) ori- ta analgésica e, talvez, pelas formas fálicas atri-
ginária do sul da Europa, que pode surgir como buídas à raiz, foi considerada afrodisíaca, ansio-
planta invasora de campos ou ser cultivada lítica e alucinogénica. Destinada a curar a
(como outros membros da família) para fins de- loucura e a participar em exorcismos e em ritu-
corativos ou alimentares. O género Lactuca en- ais mágicos ou bruxos («os médicos extraem
globa dezenas de espécies: a Lactuca sativa dela a parte de Deus que cura doenças e os
(alface comum), a Lactuca canadennis, a Lac- bruxos a parte do mal!», Krumm-Heller em
tuca serriola, etc. «Plantas Sagradas», 1987).
A Lactuca virosa, conhecida por «alface-do- Afirmava-se que só deveria ser desenterrada
ópio», é utilizada desde tempos imemoriais, por um cão preto atado por uma corda e em
quer isoladamente, quer integrando compostos noite de lua cheia. De outro modo, a planta «gri-
destinados a induzir inconsciência e a permitir taria» tão alto que mataria o ser humano que
os actos cirúrgicos, quer para outros tipos de tentasse esta manobra. Isto revela a importân-
procedimentos dolorosos 50,51 . cia social da planta! Plínio, o Velho (79 d.C.),
Referências à utilização da planta encontram-se recomenda a sua utilização para analgesia em
em documentos do antigo Egipto, do Império traumatismos e em cirurgias e a Escola de Sa-
Romano, na História Natural de Plínio, nos escri- lerno recomenda-a como elemento integrante
tos de Avicena e de Dioscorides. O imperador da esponja soporífera . Todas as componentes da
52
romano Augusto terá mandado erigir uma está- planta são tóxicas, embora a única parte utiliza-
tua em homenagem à infusão da planta que lhe da seja a raiz, a qual pode estar dividida em
terá salvo a vida! duas ou três ramificações, por vezes assumindo
A utilização da planta é citada nos registos do formas fálicas.
Mosteiro de Monte Cassino (800 a.C.) como Alguns dos processos formulados pela Inqui-
integrante da esponja soporífera (ópio, cicu- sição tiveram como potencial delito a manipula-
ta, mandrágora, alface-brava, beleno, etc.) e, em ção desta planta. Contém diversos alcalóides:
manuscritos ingleses entre os séculos XII e XVI, atropina, escopolamina, hiosciamina e mandra-
integrando uma beberagem «anestésica», desig- gorina . Induz efeitos alucinogénicos, analgési-
53
nada por Dwall. cos, narcóticos, sedativos, eméticos e purgativos.
No século XIX foi utilizada como sedativo, Ingerida em doses reduzidas bloqueia os recep-
como hipnótico e analgésico, substituindo o tores da acetilcolina com depressão da função
ópio, quando este não poderia ser obtido ou neuromuscular e em doses mais elevadas induz
utilizado. Extractos da planta foram utilizados um período de estimulação do SNC, manifesta-
pela medicina convencional europeia e americana do por alucinações, delírio e, eventualmente, a
pelos efeitos semelhantes aos obtidos pelo uso de morte.
ópio. Uma empresa farmacêutica, a Knoll AG,
comercializou Lactucyl como antitússico, seda-
®
tivo e hipnótico e outras empresas seguiram o Onagra, erva dos burros, estrela-da-tarde,
exemplo. boas-noites ou Oenathera biennis L
Em 1898, a Farmacopeia dos EUA descreveu É uma planta anual ou bianual da família das
a planta e seus efeitos, e em 1911 o Conselho Onagraceae, oriunda da América do Norte e
da Sociedade Farmacêutica Inglesa patrocinou introduzida na Europa por volta de 1615, sendo
o estudo fitoquímico da planta, sendo isoladas apelidada por «cura-tudo-do-Rei». Embora ex-
substâncias químicas: a lactucopicrina, lactuce- tractos da planta sejam utilizados sob a forma
rol e a lactucina. de infusões ou de tinturas, das sementes da
Ainda que sem evidência científica, a planta é onagra é extraído um óleo muito utilizado para
utilizada como tranquilizante, sedativo, afrodisí- tratamento da mastalgia, da síndrome pré-mens-
aco, indutor do sono e antitússico, sob a forma trual e dos sintomas da menopausa, de doenças
de fumo, de infusões e na alimentação. Os efei- cutâneas (eczema, psoríase), de hemorróidas ou
tos psicoactivos obtidos a partir do fumo das de esclerose múltipla, mas também como antio-
folhas secas são reduzidos e de curta duração. xidante, antialérgico, antiasmático, hipocoleste-
O Lactucarium ou ópio-da-alface, com efeito rolémico, antitrombótico, estimulante imunitário e
54
analgésico, sedativo, hipnótico, antiespasmódico e cosmético .
cuja semivida de eliminação é de cerca de uma O óleo contém cerca de 85% de ácidos gor-
DOR hora, tem sido utilizado para tratamento de insó- dos polinsaturados precursores das prostaglan-
dinas (substâncias biológicas formadas a partir
nias, da excitabilidade juvenil, de neuroses, de
24 dores reumáticas, de laringites, da tosse, etc. de ácidos gordos polinsaturados). Entre estes