Page 17 Analgesia em Obstetrícia
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aspectos semiconscientes e inconscientes das capacidades cognitivas da
nossa espécie para lidar com o significado (Diller). Por outro lado, a riqueza
linguística, não diminuindo efectivamente a dor, pode actuar concretamente
na limitação da angústia que se lhe associa.
Os aspectos referidos colocam problemas metodológicos, que se têm
revelado resistentes a uma solução satisfatória. Estas dificuldades incentiva-
ram múltiplas tentativas de desenvolvimento de uma abordagem objectiva
para apreciação da experiência subjectiva dolorosa. Tais medidas têm sido
importantes, ao permitirem a expressão da sintomatologia e suas variações,
através de uma descrição aproximadamente normalizada.
Contrariamente ao que ocorre na investigação laboratorial, em clínica é
evidente que nenhuma medida directa do estímulo nociceptivo pode ser
praticada. Os resultados assim obtidos, utilizando este tipo de estimulação,
levam a conclusões que devem ser extrapoladas com muita prudência às
condições clínicas.
A avaliação adequada deve ser dirigida não sobre o estímulo mas sim
sobre a resposta, isto é, a experiência subjectiva e os comportamentos
observáveis.
Na dor do parto o registo da sintomatologia deverá englobar dois propó-
sitos complementares, o quantitativo e o qualitativo.
Na prática clínica recorre-se habitualmente aos métodos classificados
como subjectivos, por oposição aos métodos electrofisiológicos, bioquímicos
e parâmetros ventilatórios englobados na medição objectiva.
Os métodos subjectivos comportam duas categorias: os unidimensionais e
os multidimensionais.
Os primeiros incluem as escalas verbais simples (EVS), numéricas (EN),
visual analógica (EVA) e de expressões faciais. Denominadas de autoavalia-
ção, permitem ao sujeito situar o nível da sua dor sobre uma escala nominal
(EVS) ou de intervalos (EN e EVA). A escala verbal simples é, em regra,
constituída por quatro ou cinco categorias ordenadas (p. ex. dor ausente,
ligeira, moderada e intensa). As escalas de intervalos permitem a utilização de
um continuum entre dois extremos, normalmente definidos como dor ausente
e dor máxima imaginável. A escala numérica constitui-se em valores de zero a
dez (ou cem). Na escala visual analógica a dor é representada por uma linha
recta de 10 cm. A principal vantagem da EVS reside na sua fácil compreensão,
já que as escalas de intervalos apresentam dificuldades acrescidas no que
concerne a este aspecto, embora se revelem mais sensíveis do que a primeira,
que comporta poucos níveis de variação. A escala de expressões faciais poderá
ser mais útil em sujeitos com défices de linguagem ou perturbações mentais.
Dos métodos multidimensionais salientamos os questionários de adjecti-
vos e, de entre estes, o questionário de McGill/Melzack para a dor (MPQ),
constituído por uma série de termos relativos à dor, repartidos por quatro
classes (sensorial, afectiva, avaliativa e mista) e vinte subclasses. A partir das
respostas obtidas podem calcular-se diversos índices, que permitem uma
análise estatística dos resultados. As suas características metodológicas de
validade, fidelidade e sensibilidade são admitidas actualmente como satisfatóri-
as. Uma das descobertas mais interessantes da investigação sobre o MPQ
reporta-se à noção de que cada tipo de dor pode ser caracterizada por uma
constelação específica de palavras (Dubuisson e Melzack, 1976), o que permitiu,
relativamente à linguagem, a definição de oito síndromes dolorosas major, entre
as quais a dor do parto. É pois evidente que indivíduos atingidos pela mesma
síndrome tendem a utilizar palavras similares para exprimirem o que sentem.

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