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enxaqueca ou de tipo tensão, ou até o despoletar da cefaleia, até então, com
episódios muito escassos e raros. Podemos verificar um acontecimento da vida
do paciente como uma perda, uma mudança de actividade, um problema rela-
cional, dificuldades económicas que condicionam reacções emocionais de
acordo com os mecanismos de adaptação de cada uma, mas insuficientes ou
desajustados em algumas pessoas nas quais evoluem para quadro de manifes-
tação somática. A vulnerabilidade prévia para uma enxaqueca agrava-se ou
então associa-se com a cefaleia de tipo tensão, sendo de difícil abordagem ou
até mesmo impossível se não se intervir na componente psicológica da pessoa.
Também através dos antecedentes podemos verificar o sucesso de anteriores
intervenções, o tipo de tratamentos, como reage e se comporta o doente, que
adesão tem às prescrições, que expectativas tem o doente sobre o tratamento
e que benefícios primários, secundários e terciários têm tido desse sintoma.
Este aspecto é importante porque nalguns doentes a intervenção multidiscipli-
nar é necessária quase desde o início, enquanto noutros uma boa relação
médico-paciente é suficiente para uma evolução favorável a par da intervenção
adequada.
Dentro dos antecedentes é fundamental verificar a história de vida
pessoal e procurar sintomatologia depressiva, fóbica e ansiosa, já que estas
estão muito frequentemente associadas a cefaleias de tipo enxaqueca e de
tipo tensão.
Os antecedentes pessoais patológicos são importantes como as patologias
ósseas, musculares, como a fibromialgia e dor miofascial que podem envolver
a região cervical e com irradiações para a cabeça, originando sintomatologia
idêntica a outras cefaleias disfuncionais.
Os antecedentes familiares são parte importante, pois, por exemplo, no
caso de enxaqueca ou variantes, existe com elevada frequência incidência
familiar e em mulheres. Também é importante questionar sobre a ocorrên-
cia de doenças depressivas na família, alcoolismo, acontecimentos vitais,
doenças oncológicas, entre outras questões que nos orientem para a pre-
sença de circunstâncias passadas ou actuais que desencadeiam reacções
emocionais.
A avaliação do estado mental sumária é muito importante já que no caso
das cefaleias primárias, na sua grande maioria, são acompanhadas por altera-
ções do estado humor de tipo depressivo ou ansioso. O clínico deve questionar
o paciente sobre o estado emocional, os acontecimentos de vida, mesmo que
não tenham acontecido no presente, os comportamentos, reacções e sentimen-
tos do doente a situações na família, trabalho ou relacionamento social. Se a
avaliação clínica geral e neurológica é fundamental nas cefaleias agudas ou de
apresentação recente, a avaliação do estado mental é sempre necessária nas
cefaleias crónicas. Todas as pessoas com cefaleias crónicas têm de algum
modo problemas emocionais resultantes da presença crónica de dor. A avalia-
ção permite determinar o impacto da dor de cabeça na pessoa e os factores
psicológicos na percepção da dor e na incapacidade do doente. Não tem como
objectivo diferenciar os doentes como tendo dor somática ou dor psicogénica.
Não existe essa dicotomia na dor. Por experiência, uma dor com etiologia só
psicológica é muito rara. É também importante conseguir distinguir o que é
uma reacção psicológica e uma doença psiquiátrica. Na continuidade do tra-
tamento é fundamental observar os factores psicológicos e colocar muito
forte suspeita em caso de falência do tratamento ou, até mesmo, boicote per-
manente de resultados.
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