Page 16 Volume 10, Número 1, 2002
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V. Araújo-Soares, T. McIntyre, M. Figueiredo: Intervenção Psicológica: Possibilidades de Colaboração entre Distintos Campos Científicos na Dor Crónica
danças clínicas significativas a nível da depressão, melhorou ainda mais do que os “adaptativos/minimi-
da limitação e da dor. Os resultados providenciaram zadores” na escala que avaliava o controlo sobre a
provas da eficácia da intervenção comportamental, vida, o que significa que para os pacientes disfunci-
que produziu resultados positivos clinicamente signi- onais a intervenção foi associada a aumentos signi-
ficativos no grupo. Utilizando os critérios de Jacob- ficativos nesta dimensão. Quanto aos pacientes clas-
son e Truax, verificou-se que 47% dos pacientes sificados como “interpessoalmente desajustados”,
exibiam alterações significativas, ao passo que 41% estes parecem não ter sido ajudados com a inter-
apresentavam resultados positivos clinicamente sig- venção, no que diz respeito à gravidade da dor e a
nificativos pelo menos numa das três medidas utili- melhoras no nível de funcionamento físico. No que
zadas no momento de pós-intervenção, apresentan- concerne aos indivíduos “adaptativos/minimizado-
do resultados similares aos da população normal. res”, verificou-se que estes apresentaram piores re-
Um estudo conduzido por Stategier, et al. (1997) sultados na escala de controlo sobre a vida do que
utilizou vários instrumentos de avaliação. O primeiro os outros dois grupos. Em contraste com os resulta-
foi a parte I do Inventário Multidimensional da Dor de dos anteriores, talvez este grupo tenha melhorado
West Haven-Yale (IMD; Kerns, Turk e Rudy, 1985), em menor escala, pois à partida já se encontrava
que mede o funcionamento psicossocial confrontan- posicionado mais favoravelmente.
do várias dimensões: a) percepção da gravidade da Em Portugal desenvolveu-se um manual de inter-
dor; b) interferência da dor na vida; c) controlo venção psicológico e multimodal na dor crónica
percebido sobre a vida; d) distress afectivo, e e) lombar (McIntyre, Araújo-Soares e Brown, 1999 em
apoio percebido dos outros. Outros instrumentos Soares, 1999), finda a fase de construção, que teve
utilizados foram o Inventário da Depressão de Beck como contributos todas as citadas anteriormente,
(versão curta com 13 itens, Beck e Beck, 1972 em procedeu-se à sua aplicação, com vista à avaliação
Stategier, et al.,1997), uma escala de suporte social da sua eficácia. Assim, o programa foi implementa-
(Social Provisions Scale, SPS; Russel e Cutrona, do junto a pessoas com dor crónica lombar. Para tal
1984 em Stategier, et al., 1997), a escala Pain Rating foram contactados os serviços de Ortopedia, Medi-
Index do Questionário da dor de McGill (Turk,1988), cina Física e Reabilitação e Consulta de Dor de dois
os coeficientes do α de Cronbach vão de 0,83 a Hospitais Distritais. A investigação realizada apre-
0,91 (Altmaier, et al., 1993; Turk, Rudy, e Salovey, sentou cariz quase-experimental, tendo participado,
1985) e a escala Low Back Pain Rating Scale (Leh- voluntariamente, 33 sujeitos no grupo experimental e
mann, Brand, e Gorman, 1983, em Wilson e Gil, 36 no grupo de controlo, com idades compreendi-
1996), que avalia o funcionamento do paciente em das entre os 18 e os 72 anos de idade. Análises
termos de critérios físicos, percepção do paciente e iniciais a estes dois grupos revelaram (apesar des-
dos médicos. Nesta intervenção, 21 pacientes rece- tes não terem sido seleccionados aleatoriamente)
beram um programa de reabilitação tradicional de semelhanças na maioria das variáveis estudadas no
terapia física e educação. Este programa consistia momento de pré-teste. Os sujeitos do grupo experi-
em sessões de terapia física duas vezes por dia, mental foram submetidos ao programa de interven-
bem como sessões diárias de treino aeróbico. As ção psicológica e à intervenção standard dos servi-
aulas diárias de educação ensinavam mecanismos ços de ortopedia, medicina física de reabilitação e
de controlo da dor e providenciavam apoio por parte dor. O tipo de intervenção médica reflectia um vasto
de um grupo. Vinte e quatro pacientes receberam conjunto de práticas médicas correntes para o trata-
esta intervenção tradicional acrescida de outro tipo mento de pessoas com dor crónica lombar. O grupo
de intervenção cognitivo-comportamental que abar- de controlo em lista de espera foi sujeito, apenas,
cava vários componentes tais como: a) planeamento aos serviços habituais (standard). Assim, o estudo
diário de exercício; b) treino de relaxamento; c) consistiu em provar a eficácia deste programa, bem
treino de biofeedback, e d) treino de estratégias de como os efeitos sinergéticos da conjugação deste
coping cognitivo-comportamentais. Dos 45 pacien- com a intervenção médica standard, tendo-se reali-
tes, 14 foram classificados como disfuncionais, 12 zado medidas pré- e pós-intervenção. Os instrumen-
como tendo dificuldades interpessoais e 14 como tos utilizados na investigação destinavam-se a ava-
indivíduos que possuíam estratégias de coping liar os resultados do programa de intervenção em
“adaptativas/minimizadoras”. Quanto aos resultados variáveis como a intensidade, frequência e qualida-
obtidos, estes indicaram que os melhores resultados de da dor, a interferência da dor no quotidiano, os
apareceram a nível dos pacientes classificados como estilos de coping, o locus de controlo, as experiên-
“disfuncionais”, o que veio replicar os resultados cias subjectivas de sofrimento, a depressão, bem
anteriormente obtidos num estudo realizado por como a morbilidade física e psicológica. Três hipóte-
Rudy, et al. (1995). Talvez estes resultados estejam ses foram testadas. A hipótese 1 previa diferenças
relacionados com o facto de os sujeitos classifica- significativas pré-pós, para o GE, nas variáveis estu-
dos como “disfuncionais” possuírem “muito por onde dadas indicando uma diminuição nas medidas de
melhorar”. As diferenças entre os grupos eram mais dor, um aumento nas estratégias de coping e uma
aparentes nas medidas físicas: os pacientes “disfun- diminuição no uso da medicação. A hipótese 2 pre-
cionais” melhoraram mais do que os “interpessoal- via diferenças significativas entre o GE e o GC no
mente desajustados”, quer nas percepções da gra- momento de pós-intervenção, com melhores medi- DOR
vidade da dor quer no funcionamento físico. O grupo das para o GE quanto às medidas da experiência da
de pacientes classificados como “disfuncionais” dor ao coping e uso de medicação. A hipótese 3 15

