Page 16 Volume 13 - N.1 - 2005
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J.M. Pereira: Enxaqueca: Genética
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como a que foi efectuada por Hovatta, et al. , lência da enxaqueca oscilou entre 10 e 13%, na
na Finlândia, e que não revelou qualquer ligação Finlândia, e 32 e 34 %, na Dinamarca e na Ho-
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ou a efectuada por May, et al. , na Holanda, que landa, e a hereditariedade variou entre 34 e
mostrou uma ligação mais frequente que a de- 57%, entre as diferentes populações.
vido ao acaso. Os estudos de segregação (sim- Estudos em famílias com variantes raras de
ples e complexa) consistem na avaliação do enxaqueca como a enxaqueca hemiplégica
risco de transmissão e na pesquisa da forma de familiar (FHM) que há um défice motor unila-
transmissão. Dos estudos efectuados mais re- teral durante a aura e episódios semelhantes
o
centemente salientam-se os seguintes: Russel e em pelo menos um membro da família do 1.
Olesen , na Dinamarca, em 1993, mostraram ou 2. grau. Em 1993, foram identificadas por
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o
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que o risco de ocorrência de enxaqueca na fa- Joutel, et al. em famílias com FHM, uma muta-
mília de um probando era 4 vezes superior ao ção no gene dos canais de cálcio neuronais
dos controlos; o risco de ocorrer enxaqueca sem CACNA1A do tipo P/Q localizada no cromosso-
aura na família de portadores de enxaqueca ma Cr. 19 posteriormente designada por FHM
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sem aura (MO) era de 1,9, enquanto que o risco tipo 1 , verificando-se mais tarde ser uma mu-
de enxaqueca com aura (MA) era de 1,4 e con- tação alélica com a AE2 e SCA6 . Em 1997,
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cluíram que a hereditariedade resulta da combi- noutras famílias com FHM, foi identificada no
nação de factores genéticos e ambienciais (mul- braço longo do Cr 1, uma nova mutação no gene
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tifactorial). Peroutka , nos EUA, em 1995, através ATP1A2 que codifica para a subunidade α2 dos
de entrevista telefónica, encontrou em portado- canais neuronais de sódio/potássio e que foi
res de enxaqueca com e sem aura uma história intitulada FHM tipo 2 27,28 , a qual se verificou ser
familiar de enxaqueca em 95% dos inquiridos e alélica de certas formas de Epilepsia (parcial
um risco acrescido (1,5x) de enxaqueca (com e secundariamente generalizada) .
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sem aura) nos descendentes. Em 2004, Lemos A descoberta do gene da FHM no cromosso-
C, Sousa A e Monteiro P, encontraram num gru- ma 19p13.1 abriu novas avenidas para o estudo
po de famílias portuguesas com enxaqueca, da genética da enxaqueca. O envolvimento des-
com e sem aura, um risco de transmissão da te gene em familiares com enxaqueca passou a
enxaqueca aos descendentes 4 vezes superior ser estudado com marcadores iatrogénicos es-
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ao da população geral . Mas, na mesma popu- pecíficos .
lação, não foi detectada qualquer ligação com o Estudos de co-morbilidade também têm sido
gene da FHM CACNA1A no Cr. 19p13 ou ao gene usados para pesquisa genética. As principais
ATP1A2 no Cr. 1q 17,18 . doenças que têm sido associadas com a enxa-
Nos estudos em gémeos foi notada maior queca com e sem aura, para além da enxaque-
concordância entre os monozigóticos do que ca hemiplégica familiar (FHM) são: CADASIL,
os dizigóticos, com uma variância média de vertigem episódica, ataxia episódica tipo 2
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50% 6-9,11,19 . Merikangas KR , em 1996, na Aus- (AE2), ataxia cerebelosa tardia (SCA6), encefa-
trália, encontrou, em 5.850 gémeos, uma con- lopatias mitocondriais (MELAS, MERF, CPEO),
cordância em MZ = 37% > DZ = 21% e con- epilepsia, entre outras 29-31 .
cluiu que a enxaqueca não era autossómica CADASIL é uma síndrome cuja designação
dominante nem ligada ao X mas que era autos- corresponde às iniciais da seguinte descrição
sómica recessiva com reduzida penetrância. da afecção Cerebral Autosomal Dominant Arte-
Honkasalo ML, et al. , em 1995, na Finlândia, riopathy with Subcortical Infarcts and Leucoen-
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encontraram uma concordância no sexo mas- cephalopathy, cujos familiares têm frequente-
culino de MZ = 22% > DZ = 4% e no sexo femini- mente enxaquecas com aura e apresentam uma
no de MZ = 32% > DZ = 19%, em 8.167 gémeos mutação no cromossoma 19p12 .
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estudados e concluíram que a hereditariedade era Estão a ser investigadas mutações mitocon-
50% genética e 50% multifactorial. Larsson e driais, com vista a uma eventual associação da
col. , em 1995, na Suécia, encontraram, em enxaqueca com as citopatias mitocondriais se-
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mais de 6.000 gémeos que estudaram, uma guintes: MELAS; MERRF; CPEO, outras mas,
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hereditariedade maior na mulher e na enxaque- até à data apenas uma mutação A-G na subu-
ca recorrente e incapacitante. nidade ND4 (proteína mitocondrial do complexo
Dois estudos recentes confirmaram a presen- respiratório I) foi detectada em 26% de porta-
ça de factores genéticos e ambienciais na en- dores de enxaqueca, no Japão 31,32 .
xaqueca. Num estudo efectuado por Svensson Também tem sido estudada a eventual ligação
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e outros , em 2003, em 341 pares de gémeos e da enxaqueca com outras doenças hereditárias,
364 controlos emparelhados, encontraram uma como sendo as paralisias periódicas familiares,
hereditariedade de 38% para os homens e 48% miotonias congénitas, etc., para pesquisa de
para as mulheres, mas não encontraram influen- possíveis mutações alélicas 31-33 , mas sem resul-
cias ambientais significativas. Mulder e outros , tados aparentes.
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em 2003, compararam a prevalência e a heredi- Outra fonte de pesquisa tem por base a fisio-
tariedade da enxaqueca em 6 países que parti- patogenia da enxaqueca com e sem aura. Ad- DOR
ciparam no GenomEU twin project, que incluiu mitindo a importância do envolvimento da sero-
29.717 pares de gémeos. Nesse estudo a preva- tonina e acessoriamente da dopamina na sua 15