Page 28 Volume 17 - N.1 - 2009
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M.J. Ramalho: Avaliação da Satisfação dos Pacientes com o Controlo da Dor Aguda do Pós-Operatório
este fica satisfeito. A desconfirmação acontece relatados por pacientes que acreditavam que a
quando a performance do produto não vai ao presença de dor era um indicador de menor
encontro das expectativas (desconfirmação ne- qualidade de vida.
gativa) ou quando excede as expectativas (des- Em suma, parece existir um denominador co-
confirmação positiva). mum em termos da satisfação do paciente com
Consistentemente, os resultados encontrados o controlo da dor que aponta para uma combi-
apontam para que os pacientes revelem eleva- nação complexa entre expectativas, itens rela-
dos níveis de satisfação com o controlo da dor, cionais, experiências prévias de dor e de alívio
mesmo tendo dor de intensidade moderada a da dor e objectivos relativos aos cuidados de
severa e esperando longos períodos pela imple- saúde prestados.
mentação de medidas para o seu alívio 17,18 .
Existem também evidências de que mesmo os
pacientes que avaliam o controlo da sua dor A que se deve estar atento
aguda do pós-operatório como muito satisfatório Provavelmente, é demasiado cedo para que
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são capazes de identificar problemas . se possa utilizar um indicador quantitativo da
As razões deste paradoxo têm sido matéria de satisfação dos pacientes com o controlo da dor
discussão na literatura. Por exemplo, Ward e aguda do pós-operatório, já que, como se vê,
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Gordon sugerem que os pacientes têm expec- há ainda muito para compreender acerca das
tativas muito baixas acerca do controlo da sua suas componentes. Uma vez que os dados de
dor. A este respeito, Kuhn, et al. relatam que que dispomos estão incompletos e são pouco
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apenas 36% dos pacientes submetidos a cirur- conclusivos, a recolha mais precisa de informa-
gia esperam uma alívio completo da dor. Malouf, ção neste domínio pode dar pistas sobre a for-
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et al. apontam para que mais de metade da ma como os cuidados de saúde podem ser
população cirúrgica não pede analgesia, apesar melhorados.
da dor. Os resultados dos estudos qualitativos podem
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Donovan questionou vários pacientes cirúr- explicitar melhor as percepções dos pacientes
gicos sobre o facto de estes estarem satisfeitos a este respeito e em vez de incidirem na avalia-
apesar de se encontrarem com dor e quase 40% ção dos serviços, devem focalizar-se na monito-
referiram que esperavam ter dor depois da ope- rização da experiência dos pacientes, exploran-
ração. do as diferentes significações associadas aos
Portanto, existem pacientes que sentem dor vários graus de satisfação e de insatisfação e
severa que não verbalizam, não esperam obter permitindo que estes expressem livremente as
alívio da dor e, ainda assim, estão satisfeitos suas percepções e preocupações.
com o controlo da dor. Num estudo realizado recentemente por Beck,
Muitos destes pacientes (90% num estudo re- et al. com esta metodologia emergiram algu-
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alizado com população espanhola por Malouf, et mas pistas que se organizaram em quatro temá-
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al. em 2006 ) dizem proceder deste modo por- ticas principais designadas por: ser bem trata-
que sentem que para os profissionais de saúde do, ter uma rede segura, formar uma parceria
o controlo da sua dor não é um assunto prioritá- com os profissionais de saúde, receber um con-
rio. Por isso mesmo, o APS Quality of Care Com- trolo da dor eficaz.
mittee propõe que o paradoxo da elevada sa- Estas componentes da satisfação foram tradu-
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tisfação, apesar da elevada intensidade de dor, zidas por:
pode ser um reflexo da satisfação dos pacientes – «Ser bem tratado» significa receber os cui-
com o staff clínico e não com o tratamento anal- dados e sentir a preocupação de profissio-
gésico. Num estudo qualitativo realizado na Fin- nais de saúde que são capazes de escutar,
lândia com 19 pacientes oncológicos submeti- responder prontamente e acreditar nos au-
dos a cirurgia , os investigadores concluíram to-relatos de dor do paciente; os pacientes
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que os pacientes consideravam que, apesar de satisfeitos sentem que os profissionais de
terem dor, os profissionais de saúde estavam a saúde se preocupam e demonstram um in-
fazer o seu melhor e não deveriam ser respon- teresse pessoal por si; os traços mais sig-
sabilizados por isso e, além disso, eles não que- nificativos que os pacientes identificam ao
riam ser maçadores. Quando os questionaram ser bem tratados são o cuidado, o estar
sobre o que deveria ser feito, na sua perspecti- atento, o estar a tentar ajudar, dar respostas
va, os participantes nesta investigação enfatiza- atempadas, o cuidado individualizado e o
ram a importância da comunicação e da simpa- ser reconhecido.
tia em conjunto com uma abordagem proactiva – «Ter uma rede segura» refere-se à percep-
face à sua dor. Num outro estudo, Dawson, et ção de que existe um plano para o controlo
al. concluíram que a satisfação dos pacientes da dor e recursos efectivos para o cumprir,
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estava directamente relacionada com a capacida- que os profissionais de saúde actuam pro-
de dos médicos e enfermeiros para valorizarem o activamente, antecipando os problemas e
controlo da dor como um objectivo central e com que os pacientes têm a possibilidade, quan- DOR
experiências anteriores de dor por parte dos pa- do viável, de ter autonomia face ao contro-
cientes. Os níveis mais baixos de satisfação foram lo da sua dor. 27
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