Page 225 Guia para o Tratamento da Dor em Contextos de Poucos Recursos
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pode exacerbar uma doença da medula óssea e causada por procedimentos clínicos deve ser
agravar os efeitos gastrointestinais observados com considerada pelos médicos e enfermeiros que tratam
o VIH ou com anti-retrovirais. A administração crianças infectadas pelo VIH, tanto nos tratamentos
contínua de opióides de longa acção é o tratamento em ambulatório como em regime de internamento.
de eleição para a dor crónica. A escada analgésica da Deve ser proporcionada às crianças uma abordagem
OMS constitui uma abordagem progressiva no multi-fásica baseada na terapêutica cognitivo-
manejo da dor, foi desenvolvida para gerir a dor de comportamental, que ensine competências eficazes
forma consistente (em particular a dor oncológica) e que permitam lidar com a situação, que pode incluir:
pode ser aplicada em todos os casos de tratamento preparação, ensaio, exercícios de respiração para
de dor. relaxamento e distracção, reforço positivo e
abordagens farmacológicas.
Descrição de caso 1 («dor
nos bebés») Deve pedir-se aos pais que saiam da sala
quando se sujeita uma criança infectada por
VIH a um procedimento?
Flavia é uma menina de 4 meses infectada pelo VIH Embora as crianças manifestem geralmente mais
referenciada pelo hospital local com CD4 de 15% (valor angústia comportamental na presença dos pais,
absoluto 489) para inscrição num programa de tratamento preferem tê-los presentes e podem sentir menos
anti-retroviral. A sua história clínica inclui um único angústia subjectiva. Além disso, os pais preferem
episódio de broncopneumonia, devido ao qual foi assistir aos procedimentos clínicos a que os filhos
hospitalizada e recebeu antibiótico por via intravenosa são sujeitos. Os pais podem incentivar e orientar os
quando tinha 2 meses. Não tem contactos conhecidos com filhos e ainda reforçar as estratégias que ajudam a
tuberculose (TP) e um teste cutâneo de tuberculina realizado lidar com a situação.
na enfermaria não produziu reacção. A mãe queixa-se de que
está «enfraquecida», não bebe o suficiente e tem lesões Como avaliar a dor em crianças infectadas pelo
persistentes na boca há mais de 2 meses, apesar do VIH?
tratamento com gotas de Mycostatin por via oral. O exame É importante definir as características da dor: a sua
revela que pesa 79% do peso previsto para a idade, com intensidade, o seu carácter, onde está distribuída e o
linfadenopatia generalizada, candidíase oral grave que se que a provoca? É preciso olhar para o nível de
estende até à faringe e uma hepatomegalia de 3 cm. desenvolvimento da criança e incentivar a
comunicação entre pais e filhos sobre a dor (ver
Devemos preocupar-nos com a dor causada por capítulo relativo à gestão da dor nas crianças). A
procedimentos clínicos em crianças infectadas história e o exame clínicos devem tentar delimitar a
pelo VIH? zona de ocorrência da dor. As crianças podem
As crianças infectadas pelo VIH são sujeitas com queixar-se de dores «em todo o lado» e podem não
frequência a procedimentos como a punção venosa conseguir precisar a localização exacta da dor.
para colheita de amostras sanguíneas, cateterização Formar os pais e prestadores de cuidados no
intravenosa, administração de medicação ou sentido de observarem as crianças poderá permitir
vacinação. As crianças hospitalizadas podem obter conhecimentos úteis sobre a origem, a
necessitar de ser submetidas a entubação intensidade e a natureza da dor. É muito importante
nasogástrica, punção lombar ou aspiração de medula tratar a causa subjacente da dor para além de
óssea. Procedimentos indolores mas causadores de prescrever analgesia. Se a dor estiver associada a um
ansiedade, como as TC, os raios-X ou a ressonância tratamento, o fármaco na origem da dor deve ser
magnética também podem causar sofrimento. Um interrompido (por ex. antivirais ddl ou D4T para
estudo de Stafford (1991) revelou que 22 crianças neuropatias periféricas), e usado um fármaco
com VIH foram submetidas a um total de 139 alternativo. Se a dor for causada por uma doença
procedimentos dolorosos num ano. A gestão da dor