Page 11 Volume 11, Número 1, 2003
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Dor (2003) 11
são e propriedades temporoespaciais do influxo. O quando partilhamos as percepções da pessoa com
córtex desempenha um papel de mediação entre as dor, estamos a partilhar as suas teorias da dor .
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actividades cognitivas e as características da di- Em termos biológicos, a dor pode ser encarada
mensão afectividade-motivação da dor. Ou seja, como um aviso útil; contudo, muitas dores são inú-
medeia as informações sensitivas das áreas corti- teis ou porque aparecem tardiamente ou se prolon-
cais sensitivas e associativas e envia projecções gam demasiado tempo . As teorias da dor tem sido
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para as estruturas reticulares e límbicas. desenvolvidas por filósofos e cientistas reflectindo
Os sistemas descendentes ou antinociceptivos fo- as correntes do pensamento da sua época (filosófi-
ram revelados com a recentemente descoberta de no cas, científicas e tecnológicas). De acordo com For-
sistema nervoso central (SNC) se produzir substânci- dham , toda a experiência de dor inclui aspectos:
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as análogas aos narcóticos . São de dois tipos: gran- • Sensorioperceptuais (discriminação da dor no
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des moléculas (endorfinas) e pequenos peptídeos tempo, espaço e intensidade).
contendo 5 ácidos aminados (encefalinas). Estas e •Emocionais/motivacionais (sentimentos negativos
seus receptores encontram-se em forte concentração que motivam respostas comportamentais à dor).
no mesencéfalo e substância gelatinosa da medula. • Cognitivos/avaliativos (conhecimento, avaliação
São substâncias que aliviam a dor pelo mesmo meca- e concepção da dor).
nismo da morfina e outros narcóticos ao bloquearem As teorias conhecidas sobre a dor focam um ou
os impulsos dolorosos ao nível da medula e cérebro. vários destes aspectos. Tradicionalmente dividem-
Em resumo, poderíamos dizer que os receptores se em teorias neurofisiológicas e psicológicas. Este
nervosos são estimulados por mediadores químicos facto reflecte a dualidade corpo-mente do pensa-
da inflamação. As fibras condutoras dos impulsos mento científico ocidental . Todavia, esta divisão
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dolorosos são: não pode ser vista como grupos de teorias concorren-
• Fibras de pequeno diâmetro Ad e C até à espi- ciais, mas como caminhos alternativos e complemen-
nhal medula (1º neurónio). tares para explicar o fenómeno da dor. Não raras ve-
• Feixes espinotalâmicos da espinhal medula ao zes estas teorias interpenetram-se, neurofisiólogos
tálamo e formação reticular (2º neurónio). usam conceitos psicológicos e vice-versa.
• Feixes de núcleos talâmicos e formação reticu- Dentro das teorias mais proeminentes destacam-se:
lar para as áreas corticais, sistema límbico e hi- •A teoria psicofisiológica do ciclo dor-ansiedade-
potálamo (3º neurónio). tensão, que defende a ideia de que qualquer
Os estímulos de dor sofrem uma dispersão ao longo interrupção deste ciclo em qualquer ponto se
do trajecto das vias aferentes primárias até diferen- traduz no alívio da dor .
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tes partes do sistema nervoso central responsáveis •No grupo das teorias neurofisiológicas, a teoria
pela cognição da dor, afectividade, controlo hormo- da especificidade ou tradicional propõe que um
nal e humoral e controlo das funções vegetativas. sistema específico da dor transporta mensa-
Importa referir que a sinapse entre o primeiro e gens de centros receptores da pele até um cen-
segundo neurónio nem sempre é directa, esta pode tro específico cerebral . A sua melhor descri-
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ser mediada por um pequeno neurónio chamado in- ção clássica foi feita por Descartes em 1664.
terneurónio . •A teoria da interacção sensitiva relata a existên-
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Paralelamente a esta via ascendente (nociceptiva) cia de um sistema de fibras de condução rápi-
existe uma via descendente (antinociceptiva). As in- da, que inibe a transmissão sináptica dos sinais
formações do córtex cerebral, hipotálamo e sistema de dor que seriam veiculados por um sistema
límbico dirigem-se para a medula após sinapses no de condução mais lento. As fibras finas surgem
tálamo e formação reticular. Na espinhal medula es- como veículos de impulsos nervosos que produ-
tes neurónios ligam-se aos interneurónios. zem a dor, enquanto as grossas são inibidoras
Todas estas estruturas estão perfeitamente desenvol- da transmissão destes influxos. Um desvio des-
vidas à 30-37ª semana de gestação, o que nos permite te equilíbrio entre fibras finas e grossas, em fa-
deduzir que o feto e recém-nascido têm dor. Adicional- vor das primeiras, traduzir-se-ía num acréscimo
mente a estes factores, os mecanismos de facilitação de transmissão nervosa, somação e dor .
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da dor parecem amplificados no recém-nascido, já •A teoria afectiva da dor acrescenta ao carácter
que existe uma indiferenciação no controlo inibitório do sensorial da dor o aspecto afectivo negativo que
processo doloroso, que apenas se encontra totalmen- impele à acção. Somos compelidos a escolher
te eficaz após o primeiro semestre de vida . Por tudo medidas adequadas para cessar a dor e este
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isto, alguns autores afirmam que o recém-nascido comportamento pertence ao domínio da emo-
pode mesmo percepcionar mais dor que o adulto 43,44 . ção e motivação .
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•A teoria Wind-up aparece no inicio dos anos 90
2.1. Teorias da dor quando investigadores observaram que estímu-
los nocivos repetidos provocavam muitas vezes
Entende-se por teoria um sistema coerente de afir- uma resposta nociceptiva muito maior do que a
mações que especificam as relações entre dois ou esperada. A medula parece ter uma barragem
mais conceitos, com o objectivo de compreender de entradas nociceptivas que aumentam mes-
DOR determinado fenómeno ou problema. Assim, com mo que os estímulos nocivos repetidos não au-
mentem . Isto foi explicado em estudos animais
uma teoria pretende-se descrever, explicar e/ou pre-
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10 ver o que se passa na realidade. Neste sentido, pela presença de uma substância, a alodina.
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