Page 31 Volume 11, Número 1, 2003
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Dor (2003) 11
Em virtude do trabalho desenvolvido pelos enfer- de serviço. Certamente, que o empenhamento dos
meiros nos vários serviços apresentar característi- enfermeiros chefes e/ou seus substitutos e o facto do
cas próprias decorrentes de variáveis como a idade, questionário ser fácil e rapidamente respondido te-
gravidade da doença, tipo de patologia e interven- rão contribuído para este êxito. A pertinência do
ção médica e cirúrgica, fomos verificar se realmente tema, que ganha cada vez mais actualidade no seio
havia diferenças nos saberes e práticas de cuidados das preocupações dos enfermeiros terá sido, em
dos enfermeiros entre os vários serviços. nossa opinião, um outro factor importante.
Pela análise do gráfico 6, verifica-se que foram os Os enfermeiros que participaram no estudo têm
enfermeiros do serviço de cirurgia que demonstra- uma média de idade jovem (35 anos), a maioria tra-
ram melhores saberes e práticas de cuidados peran- balha ainda há relativamente pouco tempo (10 anos)
te a dor na criança (77,04) e os enfermeiros que tra- e a sua experiência em serviços pediátricos é maio-
balham em consultas externas e neonatologia os ritariamente de 1 ano.
que apresentam pontuações mais baixas (66,44 e Cerca de 1/3 encontrava-se no nível II da carreira
65,66, respectivamente). de enfermagem, sendo por isso detentores de uma
Comparadas as médias entre os oito serviços, o especialização, que na sua quase totalidade era em
teste ANOVA acusou diferenças estatisticamente enfermagem de saúde infantil e pediátrica.
significativas (F = 4,901; p = 0,000).
(7,242)
Os enfermeiros que trabalham em serviços de Autoavaliação dos conhecimentos e saberes
neonatologia revelam saberes e práticas de cuida- e práticas de cuidados
dos com diferenças estatisticamente significativas
em relação aos que trabalham em serviços de medi- Quase metade dos enfermeiros afirmou ter fre-
cina (dif. média –7,6979; p = 0,023), em UCI (dif. quentado acções de formação sobre dor e a maioria
média –8,6937; p = 0,026) e em cirurgia (dif. média classifica globalmente os seus conhecimentos como
–11,3755; p = 0,001). Encontraram-se igualmente suficientes. Cerca de 1/4 refere insuficiências no co-
diferenças significativas do ponto de vista estatístico nhecimento do desenvolvimento neurológico da cri-
entre os enfermeiros das consultas externas e os ança, no modo como aparece a dor e seus efeitos
que trabalham no serviço de cirurgia (dif. média – sistémicos na criança. Globalmente têm uma ideia
10,5936; p = 0,002) (Anexo XXV). muito favorável acerca dos seus conhecimentos, ha-
vendo apenas 16,8% que se classificaram com me-
Capítulo V – Discussão nos de 52,38 pontos. Estes resultados são similares
aos encontrados em enfermeiras finlandesas .
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Neste capítulo daremos significado aos resultados Os saberes e práticas de cuidados referentes às
obtidos, tendo em conta a fundamentação teórica re- concepções que os enfermeiros fazem da dor na cri-
alizada e metodologia utilizada. ança são globalmente positivas, superando resulta-
A sua organização segue os objectivos traçados, dos encontrados em anteriores estudos . Conceber
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visando a resposta à pergunta de partida. a dor como um fenómeno multidimensional sensorial,
Encontra-se subdividido em 3 partes: caracteriza- afectivo, único e individual é o primeiro passo para
ção da população, descrição da autoavaliação dos prestarmos cuidados que englobem a dimensão psi-
conhecimentos e saberes e práticas de cuidados cossocial da dor. Todavia é importante realçar que
dos enfermeiros perante a dor na criança, explora- 1 em cada 5 enfermeiros não aceita incondicional-
ção de relações estabelecidas entre as variáveis mente que a dor na criança é tudo aquilo que ela diz
presentes e finaliza com algumas considerações que é. A forma como conceptualizamos a dor influ-
metodológicas do trabalho desenvolvido. encia a qualidade dos cuidados que prestamos .
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Os enfermeiros manifestam-se divididos quanto
1. Discussão dos resultados ao facto de encorajarem uma criança a desenvolver
A discussão dos resultados é uma etapa crucial a sua tolerância à dor. A tolerância à dor é uma res-
no processo de investigação, que dá significado aos posta única e individual influenciada por múltiplos
dados mais relevantes, à luz do enquadramento te- factores que não impedem a criança de sofrer 2,35 .
órico e metodologia utilizada no estudo, discutindo- Pelo contrário, as experiências dolorosas repetidas
se igualmente as inferências possíveis após a utiliza- tendem a aumentar a sensação dolorosa, tal como é
ção de testes estatísticos. postulado pela teoria wind-up 47,54 . Assim, tal prática
Apresentados e analisados os dados obtidos, im- apenas vai reprimir as manifestações de dor da crian-
porta agora elaborar uma reflexão crítica, confron- ça, dificultar o reconhecimento e avaliação da dor, por
tando os resultados encontrados com as opiniões parte do enfermeiro, aumentando o sofrimento da cri-
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dos autores consultados, conclusões de outros estu- ança pelo adiamento do tratamento para o seu alívio .
dos e a nossa experiência pessoal. A atitude comum de se considerarem bons doentes
aqueles que demonstram capacidade de sofrimen-
to 11,56 e o de escolher preferencialmente a via intra-
Caracterização da população muscular em detrimento da via oral na administração
A participação dos enfermeiros neste estudo foi de terapêutica para o alívio da dor , não parecem
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DOR elevada, apesar de se estar a entrar num período de prática corrente nestes enfermeiros. Em pediatria, a
via oral é uma via de eleição para administração de
férias e de vários profissionais se encontrarem au-
30 sentes do serviço por doença ou comissão gratuita medicamentos e as injecções são descritas pelas
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