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M.S. Afonso, F.L. Moreira Neto: As Células Gliais da Medula Espinhal e a Dor Neuropática: Implicações no Uso de Opióides
morfologicamente como sendo células com um neurónios dos GRD, de acordo com um padrão
soma pequeno, dele derivando muitos proces- temporal semelhante ao verificado na ativação
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sos ramificados e finos , e podem ser facilmen- da microglia, sugerindo que esta será uma pro-
te visualizadas com técnicas de imunohistoquími- vável molécula de sinalização entre neurónios
ca usando OX-42, um anticorpo que reconhece lesados e a microglia . Para além disso, tem
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CR3 em fagócitos mononucleares e que é vulgar- sido observado que os ratinhos que não pos-
mente usado como um marcador específico da suem o recetor correspondente, o recetor qui- © Permanyer Portugal 2012
microglia . Neste estado de repouso não ocorre miotático da citocina 2 (CCR2, do inglês chemo-
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ativação de vias de sinalização intracelular (como tactic cytokine receptor 2) apresentam uma
a do p38, adiante mencionado), e há pouca ou ativação microglial reduzida após lesão nervo-
nenhuma expressão de recetores, marcadores sa , o mesmo acontecendo quando um anticor-
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de superfície ou atividades funcionais caracte- po que neutraliza a ação do MCP-1 é adminis-
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rísticas da microglia no estado ativado. trado intratecalmente . A importância do MCP-1
As células microgliais são extremamente dinâ- espinhal foi também demonstrada após injeção
micas no cérebro, e rapidamente se movem em intratecal de MCP-1 em ratos normais, o que
direção ao local da lesão , fazendo com que causou proliferação microglial e comportamen-
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sejam o primeiro tipo celular a responder a di- tos indicativos de alodinia , que foram preveni-
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versos tipos de danos . Elas cumprem uma im- dos por administração de um antagonista sele-
portante função no reconhecimento e apresen- tivo para o CCR2 . A proteína CCR2 é expressa
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tação de antigénios . Face a ameaças à na microglia, mas também em neurónios, na
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homeostase fisiológica ficam ativadas e apre- pele da pata do rato, nos nervos periféricos, no
sentam respostas a longo prazo, tais como alte- local da lesão e nos GRD. Visto que os ratinhos
rações da sua morfologia, número, função e knockout para o CCR2 apresentam alodinia re-
expressão genética . A microglia ativada au- duzida, sugere-se que este recetor seja crucial
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menta de tamanho (hipertrofia) e os seus pro- para o desenvolvimento da dor neuropática .
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cessos tornam-se mais espessos e retraídos, e
em casos patológicos extremos adquire mesmo
uma forma ameboide. O número de células mi- Fractalquina (cX3cl1)
crogliais também aumenta duas a quatro vezes, A CX3CL1 é uma quimiocina expressa normal-
tal como foi constatado pela sua positividade in- mente na superfície externa dos neurónios dos
tensificada a marcadores de proliferação celular . gânglios raquidianos e do corno dorsal da me-
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As células de microglia ativadas expressam mui- dula espinhal, bem como nos astrócitos do cor-
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tos dos mesmos recetores de neurotransmisso- no dorsal após lesão nervosa . A CX3CL1 atua
res que os astrócitos e os neurónios, e uma vez no recetor CX3CR1, cuja expressão ocorre so-
ativadas produzem também várias substâncias mente na microglia e encontra-se aumentada
– as mesmas libertadas em condições imunogé- após lesão nervosa 39,40 . Quando o CX3CR1 é
nicas – que atuam em astrócitos, neurónios e inibido por anticorpos neutralizantes administra-
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outras células microgliais . dos intratecalmente, o desenvolvimento e manu- Sem o consentimento prévio por escrito do editor, não se pode reproduzir nem fotocopiar nenhuma parte desta publicação.
Em modelos experimentais de dor neuropáti- tenção da alodinia são interrompidos 40,41 . Além
ca, as áreas do corno dorsal que apresentam disso, sabe-se que a administração intratecal de
ativação da microglia coincidem com as áreas CX3CL1 ativa o p38 e o fator nuclear κB (NfκB)
que recebem projeções dos nociceptores dani- – um fator de transcrição que controla a expres-
ficados, demonstrando que os sinais enviados são de genes envolvidos nas respostas imunes,
pelo neurónio lesado são cruciais para a sua apoptose e ciclo celular – e que quando esta
ativação . Esses sinais podem ser, por exem- ativação ocorre após lesão nervosa ela é suprimi-
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plo, despolarização neuronal combinada com da por um anticorpo neutralizante do CX3CR1 .
alterações iónicas extracelulares, ou substân- A CX3CL1 é clivada pela catepsina S, uma pro-
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cias produzidas pelo neurónio , ou ainda sub- teinase da cisteína expressa na microglia espi-
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produtos da sua destruição, tais como proteínas nhal , mas também pode ser clivada pela me-
agregadas ou com a sua conformação natural taloproteinase 9 (MMP-9) . A injeção intratecal
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alterada, ou fatores nucleares . de catepsina S ativou a p38 e induziu alodinia,
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mas ambos os efeitos foram evitados pela admi-
nistração da CX3CL1 . Quando foi usado um
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Comunicação do neurónio para a microglia (Fig. 1) inibidor da catepsina a alodinia já estabelecida
Algumas substâncias produzidas pelo neurónio e foi revertida, mas o seu desenvolvimento de
respetivos recetores na microglia novo não foi afetado, sugerindo que a catepsina
Proteína quimioatratora de monócitos 1 seja importante somente na manutenção da dor
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neuropática, mas não no seu início . É sabido
A proteína quimioatratora de monócitos 1 que a CX3CL1 provoca aumento da dor através
(MCP-1/CCL2, do inglês monocyte chemoattrac- da libertação de citocinas pró-inflamatórias e NO,
tant protein-1), uma quimiocina, não é normal- e que aumenta o número de neurónios que exi- DOR
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mente expressa em neurónios . Somente em bem pós-disparos prolongados, o que é indica-
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condições de doença ela é sobrerregulada nos tivo de sensitização central e dor espontânea . 29